Melody encarava fixamente
o espelho a sua frente completamente indecisa. E, enquanto seu
reflexo devolvia o mesmo olhar intenso, ela tentava chegar a uma
conclusão.
Suspirou.
Não foi nada inteligente
da parte de Rodrigo olhá-la daquela maneira com o irmão logo ao
lado. Ela ficou totalmente sem graça quando o mesmo cochichou ao seu
ouvido: Parece que teremos uma longa conversa.
Ela mordeu o lábio sem ter coragem de olhar novamente para Rodrigo.
Também não havia sido nada apropriado ele ficar enviando mensagens
para ela pedindo para terem uma conversa que, definitivamente, não
aconteceria por uma única razão: Juliano já havia percebido apenas
em poucos segundos que estava acontecendo algo entre os dois, e isso
não era nada bom. Foi o modo como Juliano havia olhado para ela que
a fez ter certeza de que o irmão compreendera a situação. Ela era
como um livro aberto para ele.
Tudo ainda estava meio
confuso para ela. Foi estranha a forma como Rodrigo estava agindo, no
entanto, ao apresentar Juliano a ele, percebeu em parte qual era o
motivo da sua irritação. Ela só não tinha certeza absoluta se
estava mesmo certa. E, é claro que o seu irmão não estava
facilitando as coisas, ela percebeu quando ele estava prestes a dizer
algo nada amigável para Rodrigo, um pouco antes deste anunciar que o
jantar havia sido queimado. Respirou aliviada, por pouco tempo.
Então, foi aí que Rodrigo teve a brilhante ideia de enviar as
mensagens. E agora ali estava ela, sem saber o que fazer em relação
ao pedido que ele lhe fizera. Estava claro como água que ela não
iria a lugar nenhum com ele, pelo menos se a intenção de Rodrigo
era continuar respirando, pois se não, seu irmão poderia dar um
jeito fácil nisso. Juliano não era violento, mas tudo mudava quando
se tratava do bem estar da irmã.
Tomando uma decisão
definitiva, saiu do banheiro, pronta para dizer não a Rodrigo,
quando percebeu que todos haviam sumido, quer dizer, todos menos
Rodrigo que a olhava com um sorriso. Então, por aquele momento,
decidiu esquecer qualquer coisa que a afligisse, e devolveu o sorriso
sentindo-se feliz por estar enfim perto dele, e ficou
inexplicavelmente fascinada ao perceber que ela estava certa; ele
estava com ciúmes. No entanto, toda a magia do momento fora quebrada
quando abruptamente todos chegaram, e Mel viu os olhos do irmão
lampejarem na direção dela e Rodrigo antes de gritar seu nome em
advertência. E mesmo Dora tendo tentado mudar o contexto da
situação, Juliano fora mais rápido e concluiu tudo de uma só vez.
Se antes tivesse alguma dúvida, naquele momento tudo ficou mais do
que esclarecido. Ele conseguia distinguir uma péssima atuação de
longe, e a de Dora, bem, fora dramática demais. Isso bastou. A
impaciência dele era evidente para qualquer um, menos para Caio que
parecia não notar nada de estranho na situação. Antes mesmo do
jantar oficialmente chegar ao fim, ele deu um jeito de tirar Melody o
mais rápido de perto do sujeito que ousara olhar para sua irmã.
Como se ele fosse permitir que algo concreto fosse acontecer entre
esse cara e a irmã.
Melody entrou no
apartamento e mordeu o lábio inferior vendo o olhar fixo de Juliano
sobre ela.
− Por que está me
olhando assim? – indagou relutante.
− Eu não sou idiota,
Melody. – ele respondeu num tom um tanto ríspido. – Não pense
que engoli aquela história ridícula da Dora. Eu sei exatamente o
que está acontecendo aqui... – afirmou passando a mão pelo
cabelo, tentando se controlar ao máximo. – e vou logo avisando que
não vou permitir, ouviu bem? – avisou.
− Juliano, eu... –
sua voz falhou transformando-se em um sussurro. – Eu não sei do
que você está falando.
− Ah, é mesmo? –
debochou irritado, não acreditando em como ela poderia tentar
enganá-lo dessa forma. Mas ele já deveria saber que algo estava
errado, não, ele já pressentia que tinha alguma coisa errada,
definitivamente, e, por esse motivo sem aviso prévio decidiu ver o
que a irmão estava “aprontando”. – Não sei quantas vezes quer
que eu repita que sei quando está escondendo algo de mim, Melody. Se
bem que, nesse caso, a situação está bem evidente, não acha?
Melody nada disse,
parecia que seu corpo estava petrificado no meu da sala enquanto o
seu irmão dava um de louco e ficava gritando com ela por algo que
realmente nem chegou a acontecer. Quer dizer, tinha o beijo, mas
definitivamente ele não precisava nem deveria saber sobre ele.
Juliano andava de um lado
para o outro a deixando tonta, e, de repente como se ascendesse uma
luz na sua cabeça girou nos calcanhares e a encarou.
− Eu quero aquele cara
bem longe de você, Melody! – ordenou com o tom de voz alto e
decidido.
− Julian, quer ficar
calmo. Isso é totalmente desnecessário, você está exagerando. –
tentou argumentar. – Não está acontecendo nada...
Juliano soltou uma risada
no mínimo cínica.
− Nada?! Tem certeza?
Eu vi o jeito que ele estava olhando para você. Por que acha que
resolvi ficar por tempo indeterminado? Percebi o que estava
acontecendo no momento em que o vi olhando para você daquela maneira
hoje cedo, e o que acabou de acontecer... – respirou fundo. – Eu
não estou gostando nada disso. Você só pode ter perdido todo o
juízo. – esbravejou, Mel sobressaltou-se assustada. Era a primeira
vez que ele gritava com ela, isso a deixou um pouco chateada e
ferida. – Então, vai ficar aí parada, não tem nada para me
dizer?
Melody o encarou com os
olhos estreitos.
− Não sei o que dizer.
Você já concluiu tudo sozinho, certo? – respondeu irritada com
essa situação absurda.
Vendo a expressão da
irmã, Juliano percebeu que havia ido longe demais. Ficaram um longo
momento em silêncio apenas olhando um para o outro. Juliano
sentia-se péssimo por ter falado com Melody daquela forma estupida.
E Mel não conseguia ficar realmente brava com ele, afinal ela
conhecia os motivos por ele ser tão protetor com ela, mesmo que de
maneira excessiva.
Ele fechou e respirou
fundo e mantendo a calma, falou:
− Melody...
Mas fora interrompido por
Dora que havia acabado de entrar no apartamento e olhava de um para o
outro, desconfiada.
− Desculpe, estou
atrapalhando? Posso voltar depois.
− Não, Dora. Está
tudo bem. – Mel garantiu sorrindo.
Sentindo-se exausto por
causa da longa viagem, Juliano despediu-se rapidamente de Melody e
Dora com um boa noite murmurado. Mas não sem antes acrescentar:
− Esta conversa ainda
não acabou. – com a voz calma, sem ameaças. E saiu para o seu
quarto, que ficava ao lado do de Mel.
Dora franziu a testa.
− Hum, acho que a minha
historinha não deu muito certo, não é?
− Não. – Mel admitiu
com um sorriso fraco. – Mas não foi sua culpa, o meu irmão é
profissional em me ler. Mas, mesmo assim, devo agradecer, você
evitou uma situação bem pior no jantar.
− Ele parece bem
ciumento. – Dora objetivou.
− Na verdade, é bem
mais que isso. – Mel respondeu suspirando. – Boa noite, Dora!
− Boa noite!
Algum tempo depois em seu
quarto, Melody encontrava-se totalmente desperta, olhando
demoradamente para o teto sem conseguir dormir com os pensamentos
confusos. Ela entendia perfeitamente o modo como seu irmão agiu, ele
ainda era o mesmo e ela o conhecia muito bem. Assim como ele a ela.
Depois de semanas longe daqueles olhos azuis-acinzentados e meigos,
ela sentiu-se imensamente feliz ao vê-lo parado olhando para ela com
aquele sorriso bobo que só ele tinha. O apresentou rapidamente aos
amigos – nesse caso, os dois que sobraram, pois Rodrigo por alguma
razão saíra sem falar nada, deixando-a um pouco triste. Rafael e o
irmão ficaram conversando durante algum tempo, sobre Melody e o seu
recém-descoberto talento desconhecido para a música, que ela não
tinha certeza ser realmente desconhecido pelo luthier. E ao contrário
do que ela esperava, Juliano fora simpático com Caio, e este
oferecera um jantar para recepcionar o mais novo visitante e vizinho.
Os dois ficaram jogados
no sofá esperando Dora para dar a notícia de que Juliano ficaria no
apartamento delas, enquanto isso, Mel e o irmão conversavam sem
parar.
− Você realmente está
aqui. – falou maravilhada por estar finalmente na presença dele, e
sem conseguir parar de encará-lo, como se quando ela desviasse os
olhos por um momento ou picasse ele pudesse desaparecer.
− É claro que estou. –
falou apenas.
− Quando você chegou?
Onde estão suas malas? Como conseguiu me encontrar na luteria? Por
que não me disse que estava vindo? E por que está me olhando assim?
– encheu o irmão de perguntas.
− Desde quando você
fala tanto, garota? – riu divertindo-se. – Certamente, isso se
deve a quantidade de cafeína que está consumindo no seu novo
trabalho, estou errado?
− Ah, isso... eu ia
contar. – mordeu o lábio.
− Melody, tínhamos um
acordo, e você não respeitou nenhum dos meus termos, inclusive o
principal deles; nunca me deixar sem notícias suas.
− Desculpe-me. É que
aconteceu tanta coisa ultimamente. Não precisa fazer essa cara, eu
estou bem. – avisou rapidamente antes que o irmão surtasse sem
motivo. – O problema foi outro.
De maneira resumida,
contou sobre o que aconteceu com Dora. Juliano a abraçou apertado
sabendo como a morte da mãe da amiga tinha mexido com a irmã.
Depois de um momento em silêncio ele falou.
− Trabalhando numa
cafeteria e morando em um condomínio que, aliás, não me parece
nada seguro. Outro termo quebrado. Será que vou ter que começar a
listar? – indagou.
Ela deu de ombros.
− Eu gosto do meu
trabalho. Também gosto de morar aqui, é tranquilo. – sorriu. –
Aqui ninguém me conhece, sou invisível, de certa forma. Não sou a
filha de um dos milionários mais respeitados da Itália, nem a jovem
excepcionalmente talentosa que com apenas quinze anos conseguiu
entrar para a Orquestra Sinfônica de Roma. – suspirou sentindo-se
livre dos inúmeros olhares que sempre a cercaram. – Aqui sou
apenas uma garota comum. Sou apenas a Mel.
− De jeito nenhum. Você
nunca se passaria por uma garota comum, muito menos seria invisível.
– Juliano retrucou. – Você tem um brilho próprio, Mel. Esse é
o problema. – Mel levantou uma sobrancelha sem entender o
comentário. – Bem que você poderia ser um pouco menos bonita e
gentil. Sério, seria maravilhoso! – ele piscou um olho para ela e
gargalhou fazendo-a revirar os olhos. – O que me preocupa realmente
é se o nosso pai descobrir que você está morando nesse
lugar.
− Ele não precisa
saber de cada passo meu. Nem onde estou.
− Isso eu já não
posso garanti, ele já sabe que você veio para o Brasil. –
revelou. – Na verdade ele já havia descoberto há algum tempo, mas
você o conhece; sempre ocupado. – zombou.
A informação de que seu
pai já sabia onde ela estava a pegou de surpresa.
− Por que não me
contou? – questionou o irmão.
− Bom, além do fato de
você dar uma de Houdini e resolver desaparecer e não atender as
minhas ligações, eu não sabia. – justificou-se.
− Quanto tempo pretende
ficar, realmente? – perguntou sem rodeios, a ideia de tê-lo por
perto era maravilhosa, mas ele ter aparecido logo agora era um pouco
estranho. Ela o conhecia bem para saber que tinha mais nessa visita
do que ele queria contar. E mesmo sem saber o motivo original, sabia
que ela própria criara um novo: Rodrigo.
− Não sei, o tempo que
for necessário. Por que, já esta querendo se ver livre de mim? –
ele o encarou franzindo a testa e comprimindo os lábios.
− Não. – garantiu e
o abraçou. – Estou feliz que esteja aqui, de verdade. Senti tanta
a sua falta.
E toda a perfeição fora
embora. Por que o seu irmão tinha que ser tão... Argh! Será que
ele não podia ser um pouco menos cuidadoso? A resposta era; não,
claro que ele não conseguia deixar de ser o super irmão protetor
que internamente se culpava por tudo o que acontecera entre ela e o
ex. Juliano achava que poderia ter evitado o sofrimento que ele
causara a irmã, mesmo Melody tendo garantido que ele não tinha
culpa nenhuma.
Sem consegui dormir,
levantou e foi até a cozinha e deu de cara com Juliano e Dora
abraçados de uma maneira que ela não gostou.
− Aconteceu alguma
coisa? – perguntou com cautela. – Dora, você está bem?
− Ah, desculpe, Mel. –
Dora saiu rapidamente dos braços de Juliano passando as mãos no
rosto. Mel chegou à conclusão de que ela estivera chorando, e
sentiu-se uma idiota por pensar besteiras. – Acabei acordando você,
né?
− Não se preocupe com
isso. Eu não estava conseguindo dormir. – admitiu dando de ombros.
Dora se recompôs e
sorriu.
− Bom, já está tarde,
eu vou indo para o meu quarto, tenho que dormir um pouco, afinal
amanhã é um novo dia. Boa noite! – falou rapidamente e saiu.
Mel e Juliano ficaram em
silêncio por um instante.
− Por que estava
abraçando a Dora? – ela perguntou por fim, ainda intrigada.
Juliano abriu o seu
sorriso bobo, erguendo uma sobrancelha, indagou:
− Ciúmes?
Melody revirou os olhos.
− Estou falando sério,
Julian. – avisou. – Por que ela estava chorando? – sondou.
Após Juliano contar
sobre a conversa que teve com Dora, Melody o encarou.
− Eu disse para não
tocar nesse assunto. Não é fácil para ela.
− Percebi. – disse
apenas. – Por que a insônia?
− Você sabe.
− Eu sou um idiota, não
é? – Juliano falou caminhando até ela. – Vem cá. – disse a
abraçando. – Desculpe-me, não deveria ter falado com você
daquele jeito. Não consigo evitar ser o irmão chato e equivocando
que acha que pode impedi-la de viver.
− Tudo bem! – Mel
deixou se envolver pelos braços protetores, mesmo que excedidos, do
irmão. – Temos um pacto afinal, certo? – lembrou sorrindo para
ele.
Melody olhava
encantada e assustada para o mundo novo que estava a sua volta. Não
conseguia se sentir a vontade com aquele lugar, nem com o homem que
estava ao seu lado e que insistia em segurar a mão dela. Mesmo para
uma garotinha, ela tinha que admitir que ele estava tentando ser um
bom pai. Ainda a segurando pela mão ele sorriu para ela, a
convidando para descer do carro, quando fez isso e colocou os pés no
chão de paralelizados seus olhinhos brilharam com o que viu. Era um
castelo enorme, igual aos que vira nos filmes de princesas. Ficou
alguns minutos decorando cada detalhe, até o seu pai chamá-la para
entrar. Ela sorriu. No entanto, o castelo não era o que ela
esperava. Ele era grande demais e a fazia ter pesadelos. Mel queria
ir embora dali, não conseguia se adaptar a nada daquele lugar. E
nada era diferente, ela estava sempre sozinha. Seu pai dissera que
seus irmãos – que até então ela não sabia que tinha. –
chegariam em breve. E chegaram. Ela gostou dos gêmeos, contudo,
ficou incomodada com o modo como o seu outro irmão a encarava, era
estranho, ele parecia não estar olhando para lugar nenhum, mas não
desviava os olhos dela. Melody tinha certeza de que ele não gostava
da presença dela ali.
O que Melody não
sabia era que, Juliano tinha medo de chegar perto dela. Ela parecia
tão delicada e era tão bonita que assemelhava-se a uma boneca de
porcelana, que poderia quebrar a qualquer momento de tão frágil.
Ele ficava sempre a observando de longe, muitas vezes escondido, e
sorria toda vez que a ouvia falar algo.
Mas, Melody não tinha
se acostumado ainda àquele lugar estranho. Era como se todos
tentassem encaixá-la na família, como
uma peça de quebra-cabeça extra. E seu irmão mais velho não
gostava dela, esse pensamento a deixava triste, e os pesadelos não a
deixavam dormir direito, e ela estava sempre acordando todos do
castelo.
Então, certo dia
resolveu que não iria acordar ninguém, e para isso, não iria mais
dormir. Ficara horas brigando com suas pálpebras que insistiam em
fechar a cada segundo, e acabou dormindo enfim, acordando novamente
aos gritos. E para a sua surpresa, ele foi quem viera lhe salvar dos
monstros dos seus pesadelos.
− Melody? –
Juliano chamou se aproximou aos poucos da irmã, que estava tremendo.
– Você quer que eu fique aqui com você? – ele perguntou
baixinho.
− Eu não estou com
medo! – ela exclamou no mesmo tom de voz, estava mentindo, mas não
queria que ele percebesse e a odiasse ainda mais por tê-lo acordado.
− Mas eu estou. –
ele mentiu para fazê-la se sentir melhor. Pela primeira vez ela
sorriu para ele. – Posso ficar aqui com você?
− Acho que sim. –
ela falou ainda sussurrando. − Juliano?
− O quê? – ele
indagou após subir na cama e sentar ao lado dela.
− Por que estamos
falando baixinho?
− Eu não sei. –
ele admitiu sorrindo, e ela gargalhou um pouco.
Ela sabia que ele
estava mentindo, e que não estava com medo coisa nenhuma. E a partir
daquele momento ela descobriu que ele não a odiava. Juliano ficou ao
lado dela até Mel conseguir dormir profundamente. Ele murmurava uma
canção que ela não podia entender e sua voz não era nada
apropriada para uma canção de ninar. Mas Melody gostou da música
mesmo assim, ele percebendo que finalmente a irmã estava dormindo
falou:
− Não se preocupe,
Melody. Eu vou proteger você de qualquer coisa, sempre. – prometeu
sinceramente.
Melody abriu os olhos
e fitou-o.
− Eu posso proteger
você também? – ela perguntou querendo ser justa.
− Sim. – Juliano
sorriu, um sorriso que ela aprendeu a gostar desde então. – Vamos
proteger um ao outro.
A partir daquela noite em
que Juliano ficou cantarolando desafinadamente para Melody dormir,
eles se tornaram cada vez mais próximos, quase inseparáveis. E tudo
começou ali, uma pequena promessa entre irmãos que, para qualquer
outra pessoa não era nada demais, mas, que para eles funcionava como
um pacto onde ambos eram responsáveis pela segurança um do outro.
Melody pegou o cobertor e
se aconchegou ao lado de Juliano no sofá, ambos com canecas de chá
na mão, o vapor levantando o aroma mais do que bem vindo para uma
noite de insônia coletiva como essa. Fora um longo dia, mais ele
ainda não estava nem perto de acabar.
− Hum... e a Estela? –
Mel perguntou casualmente a Juliano.
− Ah, você sabe. –
deu de ombros. – Aproveitando que possui um cartão de créditos
sem limites, e esquecendo que tem filhos. – sorriu sem nenhum
humor.
Estela era a mãe de
Juliano e dos gêmeos, Pedro e Isabella. Fernando, o pai de Melody,
havia conhecido Estela ainda na faculdade, casando-se com ela após
alguns anos de namoro. E desde o início o casamento não fora muito
bem, nem mesmo com o nascimento do primogênito. Estela era um
espirito livre, como autodeclarava, e ficar presa a um casamento que
não valia a pena, não tinha nenhum sentido. Por isso optou por
sugerir o divórcio, que pelo o quê Melody sabia, foi dado de bom
grado por Fernando. Desde então, Estela tem viajado mundo a fora
gastando o dinheiro do divórcio perfeito. Ela não conhecia muito
bem a história entre a sua mãe e Fernando, já que ele nunca tocou
no assunto, e Mel não tinha certeza se queria ouvir que havia
nascido de uma aventura sem sentindo. A única coisa que soube, pela
espirituosa Estela, foi que, após alguns anos, Fernando e Estela
resolveram tentar mais uma vez, e logo depois vieram os gêmeos, e
novamente o divórcio. Melody não achava a mãe dos seus irmãos uma
má pessoa, ela era apenas despreparada para ser mãe, no entanto, de
um jeito torto, ela tinha seu próprio jeito de o ser.
Mel mordeu o lábio
sabendo que não deveria ter tocado no assunto.
− Julian...
− Eu estou bem com
isso, Melody, você sabe. – garantiu. – Só não acho justo com
os gêmeos, principalmente com a Isabella. Ela sente saudade da mãe,
e agora de você. – ele olhou para ela, Melody se encolheu
sentindo-se mal por não estar perto da sua irmãzinha, que ao
contrário do seu irmão Pedro, que era independente e possuía um
gênio tão forte quanto o de Juliano, Isabella era sensível e via
em Melody um pouco do que gostaria de ver na sua mãe. Melody a
adorava, a vira crescer e nunca havia se separado dela, até agora.
Os dois ficaram em
silêncio por alguns minutos, até Mel o quebrar indo direto ao ponto
que os trouxeram ali.
− O Rodrigo é...
diferente. – falou mordendo o lábio inferior, evitando olhar
diretamente para o irmão. – Será que não pode apenas confiar em
mim e na minha avaliação?
− Sinto muito, mas você
sabe que não posso fazer isso. Da última vez... – Juliano fez uma
pequena pausa e respirou fundo, sabendo que suas palavras poderiam
magoar a irmã. – você se enganou. Melody, eu não consigo não me
preocupar com você. Como poderia se tudo o que mais quero é
protegê-la? Talvez eu esteja sendo... exagerado, mas se soubesse que
algo desse tipo poderia acontecer, nunca teria permitido sua vinda
para o Brasil.
− Eu não planejei nada
disso. – sua voz saiu como um sussurro fraco. – Mas... eu gosto
dele.
Juliano a encarou com
atenção.
− Infelizmente, acho
que é bem mais que isso, certo?
Ela nada disse.
− Eu só não quero que
aconteça o mesmo que ocorreu entre você e o Victor. – afirmou. –
Esse Rodrigo pode até parecer uma pessoa honesta e diferente como
você mesma disse, mas entenda que eu não vou permitir que qualquer
um que possa lhe oferecer algum risco se aproxime de você.
Melody não se
surpreendeu com a declaração de Juliano, já esperava por essa
inflexibilidade. Então, bebericou um pouco do liquido quente, não
conseguindo controlar sua expressão o suficiente para olhar para
ele, então resolveu mudar de assunto, em parte.
− Por falar no Victor.
Você conseguiu, ele parou de me ligar. O que você fez Julian? –
vendo que ele demorava em responder, olhou em sua direção. Ele
parecia distante, como se tentasse desviar da resposta, sabendo que
Melody não gostaria dela. – Juliano?
− Não fui eu quem fez.
– ele defendeu-se rapidamente, a encarando falou. – Foi nosso
pai.
− Você contou para
ele? Você prometeu...
− Não! – contornou.
– Quer dizer, não... diretamente.
− Explique-se. –
pediu com um suspiro.
− Nós estávamos
discutindo sobre você, é claro, e quando percebi acabei falando que
o idiota do Victor estava te perseguindo.
− Ele não estava... me
perseguindo.
Ele inclinou a cabeça de
lado arqueando as sobrancelhas.
− Melody, você trocou
o número do seu celular diversas vezes, treme só de ouvir ou
pronunciar o nome dele, também sei que você estava evitando sair de
casa porque inexplicavelmente ele sempre dava um jeito de aparecer
onde quer que você estivesse. – Melody o encarou confusa, ela foi
pega de surpresa com as afirmações. Ele não teria como saber nada
disso, pelo menos, não se ela mesmo tivesse contado. E ela evitou
falar sobre esse assunto para não deixá-lo preocupado sem
necessidade. − Não me olhe assim, foi um dos nossos seguranças
que me informaram há alguns dias. E isso, cara irmã, chama-se
perseguição.
− Os seguranças também
estão sempre onde eu estou. – Melody murmurou.
− Eles são pagos para
isso. – ele retrucou.
− O Victor não é uma
ameaça. – ela assegurou. – É só um imbecil.
− Que pode se
transformar em um psicopata. – Juliano retorquiu novamente, não
entendendo por que ela o defendia. – Eu sei que prometi não
questioná-la sobre esse assunto, mas... seria mais simples se me
contasse o motivo do término do relacionamento de vocês.
− Não quero falar
sobre isso. – ela admitiu. – Hoje não, por favor.
Juliano estava ficando
impaciente com essa história. Há meses que tentava encontrar uma
maneira de descobrir a verdade, e nunca conseguia. E Melody sempre se
recusava a falar sobre o que aconteceu.
− Você sabe que eu
estou aqui, sempre vou estar não importa o que aconteça. – ele
prometeu segurando a mão dela firmemente.
− Eu sei, Julian. –
recostou a cabeça no ombro dele e relaxou, indagando a seguir. –
Afinal, o quê que... o papai fez? Nada que envolva a policia, um
lago e um corpo não encontrado, espero. – tentou fazer piada.
− Ah, não. O Poderoso
Chefão foi mais sútil dessa vez. – Juliano brincou, ficando sério
em seguida. – Na verdade eu não sei o que ele fez, depois de uma
reunião na empresa ele chamou o Victor na sala dele e disse que eu
não poderia estar presente. Bom, seja o que for que ele tenha dito
ao Victor, me fez entender a expressão olhos flamejantes. Achei que
ele poderia por fogo no prédio todo.
Ela revirou os olhos, e
ambos riram baixinho para não acordar Dora. Tanta conversa, acabou
deixando-os sonolentos e após um rápido boa noite, finalmente,
conseguiram dormir.
♣ ≈ ♣ ≈ ♣ ≈ ♣
Alguns dias se passaram,
e, mesmo assim, Juliano não dava uma trégua. Seu descontentamento
para com Rodrigo estava cada vez mais evidente, principalmente quando
casualmente se encontravam em algum momento do dia e Juliano sempre
lançava um olhar com o recado secreto: Fique
longe da minha irmã. Era desconcertante.
Então, já que, de uma
maneira estranha seu irmão e Bia estavam se dando bem – estranho
porque ao apresentar Juliano a Bia Melody esperava a mesma reação
que ela sempre tivera com os rapazes, no entanto, Bianca surpreendera
agindo de maneira casual. É lógico que quando ele não estava por
perto Melody sempre a ouvia suspirar e sussurrar o quanto Juliano era
perfeitamente italiano. – Melody pediu a amiga para tirar o irmão
um pouco do seu lado, e o levar para qualquer outro lugar. Os olhos
de Bianca brilharam com o pedido, e Melody se arrependeu
imediatamente de tê-lo feito. Mas precisava respirar, e ele a estava
sufocando, pois Juliano estava com a ideia fixa de que Rodrigo
costumava aparecer ali sempre, e mesmo Bianca garantindo que não,
ele se recusava a sair de perto dela um só segundo que fosse. Ele já
havia consumido mais cafeína do que ela julgava necessário, e só
iria piorar o comportamento impaciente dele.
Nesse momento, Melody
estava de costas para a porta quando ouviu alguém entrar no café.
Surpreendeu-se ao virar e encontrá-lo bem ali, parado e a encarando.
Ah, não!,
exclamou em pensamento.
− Rodrigo? O que está
fazendo aqui?
− Preciso falar com
você. – falou. – Eu vi quando o seu irmão saiu com a Bianca,
então aproveitei a deixa. – sorriu fazendo o coração de Melody
pulsar um pouco mais rápido que o normal.
− Ele não vai demorar.
– ela avisou, ignorando o efeito que ele tinha sobre ela, ou pelo
menos, tentou. – O que você quer?
Rodrigo a avaliou com um
olhar enigmático.
− Bom, pelo o que
entendi, o seu irmão me odeia. E já que não tenho nenhuma forma de
falar com você sem que ele esteja por perto, e ainda não sou
suicida, vim te fazer um convite. – sem esperar por algum
questionamento da parte dela, prosseguiu. – Sabe aquela pracinha ao
lado do condomínio? – Mel assentiu. – Ótimo, encontre-me lá
hoje à noite.
A única coisa que ela
conseguiu fazer foi piscar, em descrença.
− Você só pode estar
brincando, ou ficou louco. O Juliano nunca vai me deixar sair à
noite para encontrar você,
Rodrigo.
− Essa situação toda
está me deixando meio maluco mesmo. – admitiu com um sorriso
franco. – Precisamos esclarecer o que esta acontecendo entre a
gente, Mel, e você sabe disso.
Engolindo em seco, ela
falou com a maior calma que pôde no momento.
− Vou tentar ir.
E com um sorriso
triunfante, ele saiu.
♣ ≈ ♣ ≈ ♣≈ ♣
− Então, isso tudo
será no sábado. Você vai passar o dia inteiro com a Carol, não é
legal? – Melody falou para Dora, esperando que ela não fizesse
nenhuma pergunta especifica. Logo após Rodrigo sair da cafeteria –
depois de fazê-la prometer aparecer em um encontro que ela nem tinha
certeza se conseguiria. – Caio também resolveu aparecer para pedir
um favor, que ela sabia que seria quase impossível cumprir. Mentir
não era um dos seus talentos, a única vez que conseguiu enganar
alguém com uma inverdade, fora com o pobre do síndico com o caso da
barata voadora inexistente. Isso iria ser muito difícil,
principalmente agora que estava desconcentrada pensando em algo que
Caio havia lhe dito quando ela questionou sobre o jantar, e ela não
gostou do que Caio disse que Rodrigo havia falado.
− Mas, a Carol não me
falou de passeio nenhum. – a amiga falou sem entender nada. −
Além disso, eu não trabalho no final de semana.
− Er... bem... – Mel
não sabia o que dizer. Juliano ouvira a tudo, e percebeu o que
estava acontecendo. Mel lhe lançou um pedido de socorro silencioso.
− É que é uma
surpresa para a Carol, Dora. – ele falou com naturalidade. – Será
um dia inteiro só para vocês duas. Um dia de garotas. – Juliano
olhou para Melody com os olhos estreitos, ela deu de ombros.
− Você também vai? –
Dora perguntou a Mel.
− Ah, não. Eu vou
ficar com o Juliano... vamos... hum, ao shopping. – falou. − E
você não deve comentar nada com ela, aja naturalmente. – Melody
completou.
− Tudo bem. – Dora
concordou. − Quanto mistério! – exclamou revirando os olhos e
indo para o seu quarto.
Juliano aguardava uma
explicação.
− Agora será que pode
me dizer por que ajudei você a mentir para a sua amiga? –
questionou.
− Quem disse que eu
estava mentindo? – Mel tentou se fazer de desentendida, não
funcionou. Suspirou derrotada. – É uma longa história, que nem eu
entendo muito bem. – declarou contando o que Caio fora pedir para
ela mais cedo no café, Melody teve que enfatizar que ele fora
sozinho e ele acreditou já que ela não estava dizendo nenhuma
mentira. Se ele tivesse feito a pergunta de forma diferente, aí sim
ela não teria como esconder a verdade.
− Não gosto do que
acabou de me dizer. – Juliano falou inquieto.
− Por quê? – ela o
questionou. – Não vai querer pegar no pé da Dora também, não é?
− É isso o quê você
acha que eu faço, pego no seu pé maninha? – indagou fazendo
biquinho. – Você me magoou.
Melody gargalhou atirando
uma almofada na direção dele. No entanto, Juliano ficou serio
rapidamente.
− O que estou querendo
dizer é que, se ele está em dúvida e não sabe o que sente pela
garota, ou pensa que não sabe, essa história esta fadada ao
fracasso. – afirmou sem rodeios. – Não é difícil decifrar a
situação. Ele a quer por perto, mas, por outro lado, não vai dar
nenhum passo que possa comprometer e estragar o que existe entre os
dois. É claro, que tem a possibilidade de existir outro alguém
nessa história, o que pode deixar tudo ainda mais complicado. Alguns
homens são inconstantes e indecisos. Acredite, sei bem do que estou
falando, afinal sou um deles.
Melody suspirou,
sentindo-se um pouco tensa.
− Falou o Dom Juan
especialista. – brincou para tentar amenizar o desconforto.
− O que eu posso fazer,
oh doce e querida irmã? Seu irmão é o máximo. – ele retrucou
com uma gargalhada sonora, que Melody não teve como ignorar e
gargalhou junto.
− Juliano? – indagou
alguns minutos depois.
− Sim?
− O quê me entrega?
Digo, quando estou tentando
mentir.
− Seus olhos. Você não
consegue fixar o olhar em alguém quando está tentando
mentir, sua consciência não permite. – afirmou olhando-a
desconfiado. – Por que a pergunta? Nem adianta praticar, a mim você
nunca conseguirá enganar. – avisou.
♥ ≈ ♥ ≈ ♥ ≈ ♥
Isso é loucura, sem
dúvida nenhuma. Melody pensou ao atravessar
a rua em direção a tal pracinha que Rodrigo insistiu em
encontrá-la. Mas é uma loucura boa,
concluiu ao avistá-lo há apenas alguns metros de distância.
Não havia sido difícil
escapar dos olhos atentos de Juliano. Graças ao fuso horário que
ainda estava mexendo com os sentidos do irmão, ele acabava dormindo
sem se dar conta do que acontecia a sua volta. E assim, Mel conseguiu
dar um jeito de sair de casa sem acordá-lo. E mesmo estando ali, ela
ainda sentia uma indecifrável chateação em relação ao o que Caio
lhe dissera. Por que Rodrigo diria que um jantar entre Caio e Dora
não seria uma boa ideia? Que romance não era adequado? Foi por esse
motivo que, mesmo com Juliano ao seu lado, ela lançou um olhar
zangado e questionador na direção de Rodrigo algumas horas antes.
− Oi! – ele falou
sorrindo.
− Oi! – ela por outro
lado foi seca no cumprimento.
− Por um momento pensei
que você não viria. – ele falou se aproximando. Melody parou e o
encarou seriamente. – Principalmente depois daquele olhar que me
lançou no elevador mais cedo. O que foi aquilo?
− Nada!
− Está chateada
comigo, é isso?
Ela o encarou com um meio
sorriso.
− Não se martirize
senhor “eu entendo as mulheres”. – falou de forma irônica e
irritada. – Você não é o centro do universo.
− Tudo bem, por que
está sendo tão irônica e o que foi quê eu fiz dessa vez? – ele
perguntou querendo entender o que estava acontecendo. – Me explica,
porque não estou entendendo tanto antagonismo da sua parte.
− Por que disse ao Caio
que ele não deveria chamar a Dora para sair?
− O quê? – ele não
esperava por essa pergunta, ou melhor, acusação. – Espera um
minuto! Eu não disse isso, exatamente. É que... – fez uma pausa.
– O Caio é um pouco complicado, eu só não quero que ele se
precipite e acabe magoando a Dora. Mas posso saber por que isso a
deixou tão aborrecida? – perguntou mudando de assunto.
− Para mim é
indiferente. – falou apenas, mas sentindo-se estranhamente
aliviada.
− Então por que falou
como se estivesse me acusando? Você não ficou com ciúmes achando
que eu e a Dora...
− Não seja ridículo.
Por que eu ficaria com ciúmes?
Rodrigo sentiu-se
inexplicavelmente nervoso.
− Vamos esquecer o Caio
e a Dora por um momento? Eles são adultos e podem se entender
sozinhos. Vamos falar de nós dois. É você quem eu quero! – ele
falou abruptamente. Melody o encarou sem nada dizer, estava chocada
com as palavras de Rodrigo. Não era para menos, o próprio ficou
surpreendido com tamanha coragem que teve, e já que a havia
adquirido instantaneamente, decidiu aproveitá-la para falar o que
esteve querendo há dias, mas sempre existia uma situação ou alguém
que acabava atrapalhando os seus planos. − Eu estou apaixonado por
você! – declarou-se sentido um pouco mais leve, como se estivesse
tirando um peso significativo das costas. Porém, seu alívio durou
pouco, pois Mel o encarava impassível. Uma parte dela estava feliz
por finalmente ouvir tal declaração, mas a outra estava apavorada,
pois ela sabia que agora era a sua vez de dizer algo. Mas as palavras
estavam presas na sua garganta, sufocando-a.
Ele tentou chegar um
pouco mais perto dela. Melody estremeceu, apreensiva com o que
poderia acontecer em seguida.
− Rodrigo... – Melody
recuou alguns passos erguendo as mãos em sua direção. –, não se
aproxime. – alertou com o coração disparado.
Ele suspirou por um
momento, e sorriu decidido.
− Eu já entendi, Mel.
– se aproximou lentamente. – Você não quer que eu a beije
novamente, e vou me comportar, prometo. Mas você sabe que precisamos
terminar a nossa conversa.
Melody ponderou um pouco,
e soltou a respiração que estava prendendo inconscientemente –
porém seu coração continuava acelerado. Deixou que ele se
aproximasse e segurasse sua mão como fizera há alguns dias no
apartamento dele. Sentindo o calor da mão dele na sua, ela falou:
− Eu já disse que é
complicado...
− Claro, por um momento
quase esqueci o seu irmão repelente. – ele fez uma careta e
revirou os olhos. – Aliás, quando é que ele vai embora mesmo?
Ela o encarou seriamente.
− Ei, ele pode ficar o
tempo que quiser. – disse em defesa do irmão.
− Ele não me deixa
chegar perto de você. Tenho certeza de que se ele soubesse que você
esta aqui comigo não pensaria duas vezes antes de me matar... sem
pestanejar.
− O Juliano só se
preocupa comigo.
− Eu sei.
Agora eles estavam tão
próximos que cada um sentia a respiração do outro sobre o rosto.
Porém, ele não tentou beijá-la mantendo sua palavra, mas
envolveu-a com um abraço terno e ao mesmo tempo apaixonado.
− Será que não
podemos ficar apenas assim? – Melody questionou após um leve
suspiro. Ela gostava de ficar perto de Rodrigo, e, nesse momento, o
simples fato de estarem tão próximos como estavam, a deixava com a
sensação de completude, era perfeito.
− Assim? – Rodrigo
ergueu uma sobrancelha em dúvida.
− Perto um do outro,
sem esperar nenhum outro gesto. – falou erguendo a cabeça para
olhar em seus olhos azuis. – Olha, eu entendo que... isso que
estamos sentindo é real. – falou tentando domar seu nervosismo. –
Mas, também acho que devemos ir com calma, sei que você concorda
comigo. Não estou negando estar apaixonada por você, seria
impossível. – fechou os olhos por um segundo e ganhou coragem para
dizer o que realmente queria. – Porque, eu estou... apaixonada por
você, Rodrigo. – mas, ao contrário do que Rodrigo havia sentido,
Mel parecia ficar cada vez mais nervosa, principalmente agora que
falara o que sentia com todas as letras. Prosseguiu. − E de certa
forma isso me assusta. O que estou querendo dizer é que, não
devemos atropelar as coisas, nem nos conhecemos direito e... eu ainda
não me sinto preparada para um novo... relacionamento. – respirou
o mais profundamente que pôde. – Além disso, tem o Juliano. –
Melody sorriu ao ver Rodrigo repetir a mesma cena de antes. – Não
faça essa cara, senhor Evanz. – brincou, mas logo em seguida ficou
seria novamente. – Eu sei que pode não parecer, mas ele é mais do
que só um irmão mais velho querendo proteger a irmã do mundo vazio
e cruel que existe indubitavelmente lá fora. O Juliano é o meu
melhor amigo, meu porto seguro, e muitas vezes, é como um pai para
mim. O meu irmão é muito importante para mim, Rodrigo, não
suportaria nem mesmo a ideia de decepcioná-lo. Você consegue
entender isso?
− É claro que sim,
Mel. – afirmou.
Os dois ficaram
encarando-se por alguns minutos, o silêncio era a única coisa entre
os dois. Melody interpretou essa falta de diálogos de forma errada,
e falou um pouco triste:
− Acho que eu sou muito
complicada para você.
Ele meneou a cabeça
sorrindo.
− Não é nada disso. É
que... – levou a mão até o rosto dela retirando uma mecha de
cabelo que havia caído sobre seus olhos. – estou me sentindo um
adolescente – sorriu torto. –, esperando o aval do irmão mais
velho da garota que tomou conta dos meus pensamentos na esperança
desesperada de... cortejá-la. – seu sorriso aumentou e Melody
sorriu junto, sentindo-se encantada por essas palavras. – Na
verdade, estou me sentindo como um personagem de um romance de época.
– ele olhava fixamente nos olhos dela, seus rostos estavam tão
próximos que inevitavelmente ele sentiu o desejo de tocar os seus
lábios nos dela, sentir a maciez daqueles lábios novamente. Mas
como prometera não fazê-lo, conteve-se ao máximo e encostou sua
testa na dela fechando os olhos e sussurrando em seguida. – E sobre
ficarmos apenas assim, perto um do outro, está mais do que perfeito
para mim.
− Obrigada. – falou
com a voz fraca devido a aproximação exagerada de ambos, porém,
sentindo uma estranha paz que ele sempre conseguiu passar quando
estava por perto.
Rodrigo reforçou o
abraço, deixando-a ainda mais tranquila. Ele poderia se fazer
milhares de perguntas diferentes em relação ao que sentia por essa
garota de olhos cativantes e insondáveis. E uma dessas perguntas
seria, sem dúvida; Como foi se apaixonar logo por ela, alguém que
mal conhecia, mas, que de forma indecifrável, conseguia exercer
sobre ele um fascínio exorbitante? A única resposta seria simples;
quem se importa?! Melody era especial, tinha algo em seu jeito que
simplesmente o fazia ter esperanças. Cada gesto seu era único,
singular. Cada palavra sua para ele era encantadora... E quando a viu
e ouviu tocar aquele instrumento que parecia ser um complemento dela,
sentiu como se estivesse em outro plano, um espaço completamente
diferente onde somente era habitado por eles. Como poderia não
se apaixonar por ela? Essa sim era a pergunta que se fazia nesse
momento, enquanto a fitava com minuciosa atenção o seu rosto de
traços delicados, e a tinha em seus braços. Eu
não saberia como, concluiu com um sorriso.
− Hum... então esse é
o meu desafio, convencer o seu irmão durão de que estou apaixonado
por você e que não pretendo de forma alguma machucá-la?
− De certa forma, é
sim. – confirmou.
− Sempre gostei do
perigo. – ele brincou, rindo em seguida.
Ela revirou os olhos.
− Idiota!
Ele pousou a mão em seu
rosto.
− Linda!
Mesmo a noite estando
perfeita, eles decidiram encerrá-la por ali. No entanto, ficaram
indecisos olhando intensamente um para o outro, enquanto cada um
deles mantinham as mãos nas maçanetas das suas respectivas portas.
Numa decisão rápida, Rodrigo se aproximou depositando um beijo na
testa de Melody, que suspirou com o gesto. E ainda sentindo-se um
pouco zonza, entrou no apartamento com um sorriso bobo no rosto.
− Entrando furtivamente
em casa a essa hora, senhorita Angnel? – uma voz surgiu de repente
fazendo Mel congelar onde estava. – Tsc... tsc... tsc... O que o
seu irmão vai pensar? – Mel suspirou aliviada ao virar e encontrar
Dora parada no meio da sala, e sorriu para a amiga que estava se
controlando para não gargalhar.