Os meses passaram voando. Dora estava se dando muito bem
em seu novo emprego e de certa forma até estava gostando, embora ainda houvesse
algo dentro de si que não era aquilo que ela queria pra ela, mas tudo estava
fluindo tão rápido em sua vida que deixou as boas aguas que a trouxeram até ali
continuar a leva-la para onde quer que seja. A única coisa que ela queria era
paz em sua vida e em seus sentimentos.
Já se passaram dois dias depois da longa viagem que fez e
ainda não teve tempo de organizar tudo que trouxe de novo. Roupas, sapatos e
acessórios estavam tomando conta de seu guarda-roupa, logo teria que adquirir
um novo ou começar a se livrar de algumas coisas que já não usava mais.
Tentando organizar suas coisas observou a sacola de presente florida que estava
em sua escrivaninha. Dora foi até ela e leu o cartãozinho que ela mesma tinha
colocado.
-Carol. – Leu reflexiva.
Lembrou-se que comprou um presente para garotinha e
decidiu que estava na hora de entregar então resolveu terminar de guardar suas
coisas depois – talvez nem precisasse guardar, afinal logo teria que refazer as
malas para fazer o cruzeiro com seus amigos – Pegou seu celular e o mesmo
tocou.
-Lia – Leu na tela do celular. – Antes tarde do que
nunca, não é minha cara irmã? – falou ao atender.
-Me desculpa Dora, ou devo dizer Isadora Evanz ?! – Dora
percebeu que a irmã mesmo estando distante estava atenta às revistas de moda –
Tenho estudado sem parar e arranjei um trabalho de meio período para ajudar nas
despesas com o meu pai e acabei esquecendo de ligar. – Lia explicou-se – Mas,
você poderia ter ligado também, né? Como está? Não espera ai. – Antes que Dora
falasse alguma coisa ela ouviu que a irmã mexia em uma espécie de papeis -
Isadora Evanz regressou de Rio de Janeiro a Quatro Rios acompanhadíssima do
modelo David...
-Lia... – Dora interrompeu a irmã – Já vi que você sabe
mais ou menos o que está acontecendo por aqui só que eu estou de saída. Posso
te ligar quando eu voltar? – Pediu Dora – À noite te conto tudo. Pode ser? Tem
muita coisa que você não sabe.
-Tudo bem. Mas, eu quero saber de tudo viu. – Lia falou
em uma empolgação que a irmã desconhecia – Olha, eu espero que seus colegas de
escola vejam tudo que está saindo na
mídia sobre você – Dora revirou os olhos – Eles vão se arrepender de ter te desprezado
tanto.
-Você realmente não precisava me lembrar disso. – Disse
chateada – E minha vida não tem mais nada a ver com eles. Agora põe um ponto
final nesta história. – Desligou sem ouvir a irmã se despedir.
Não estava a fim de relembrar o passado seus planos era
olhar para frente, então não deu importância para o que a irmã disse e saiu em
direção ao apartamento da Carol.
Bateu na porta e se surpreendeu quando Caio a abriu.
-Caio o que faz aqui? – Perguntou pasma.
-Vim fazer uma visita para Carol. E você? – Perguntou o
rapaz com o seu mais belo sorriso.
-Eu vim visita-la também e... trazer o presente que
comprei pra ela. – Disse sem jeito e deixando seu rosto corar.
Ela conseguia manter a pose com todos, mas aquele sorriso
e aqueles olhos verdes a faziam perder toda compostura.
Esquece ele Dora – Repetia mentalmente pra si mesma.
- Você dois tem o mesmo pensamento e a mesma sorte. –
Anunciou o pai da garotinha fazendo com que Dora reparasse que não estava a sós
com Caio. – Aqui está à chave Caio.
Cláudio passou para Caio o que para Dora estava parecendo
a chave de um carro.
-Ela está no balé e eu ia busca-la só que Caio se
ofereceu para ir... – Esclareceu o pai da garota. – Se quiser pode ir com ele.
Apreensiva Dora olhou para Caio.
-Depois do balé vou levar a Carol para uma lanchonete. –
Caio disse fitando-a – Vem comigo?
-Acho melhor não.
– Ponderou a garota.
-Quando você viajou ela ficava me ligando todo dia
perguntando quando você voltaria. – Informou o rapaz – Ela gosta muito de você
e ficará muito feliz de vê-la.
Dora engoliu seco e considerou que seria bom poder passar
um momento com Caio e Carol e mesmo que as coisas estivessem bem entre ela e o
rapaz ela queria conversar com ele.
-Ok. –Respondeu afinal.
Os dois ficaram em silêncio até o trajeto da escolinha de
balé. Dora queria muito conversa pra ver se a amizade deles ainda permanecia
intacta, porém não sabia por onde começar.
Chegando a escolinha eles entraram na esperança que a
aula havia acabado, mas decepcionados tiveram que esperar.
Dora estava impaciente olhando para todos os cantos das
paredes e nervosa batia os pés inquieta.
-Olha se quiserem podem ir ali ao corredor, tem uma
parede de vidro que dá pra ver as meninas dançando. – Falou a recepcionista
para os dois.
Dora olhou séria para a moça e permaneceu calada e Caio
agradeceu sorrindo.
-Desculpa me intrometer – Novamente a recepcionista falou
com eles – Quem é a filha de vocês?
-Hã? – Caio e Dora disseram juntos.
-Quem é a filha de vocês? – A recepcionista repetiu a
pergunta percebendo que eles não entenderam – Vocês não estão esperando sua
filha ou quer colocar sua filha no...
-Nossa filha não faz balé. – Caio disse sem pensar
interrompendo a moça – Quero dizer. Não temos filha.
-Não somos casados ou coisa parecida. – Dora disse rindo
um pouco nervosa. – Só viemos buscar a Carol o pai dela deve ter ligado
avisando.
Dora sonhava com o dia em que se casaria e formasse uma
família, porém essa realidade estava bem longe de acontecer e ser questionada
se a sua filha e de Caio faz balé a fez rir.
-Ah sim. – Confirmou a recepcionista um pouco sem graça.
– Mas, mesmo assim podem ir vê-la dançando. Fiquem a vontade – Dizendo assim a
recepcionista saiu da sala de espera.
Dora permanecia em silêncio e Caio percebeu que havia
algo de errado com ela.
-Vamos lá ver a Carol? – Tentou animar a garota que
parecia triste envolta aos seus pensamentos.
Dora não disse nada apenas balançou a cabeça negando
fazendo com que Caio ficasse abismado.
-Qual é Dora? É balé e toda garota que se preze ou sonha
em fazer ou assistir um recital. – Falou indignado – Se você não vai eu vou. –
disse se levantando.
-Você não é uma garota. – Ela analisou ainda com aquela
cara que Caio não estava gostando nada.
-Eu quero ver a Carol. – Dizendo isso ele saiu.
Ela estava ainda apreensiva. Queria poder ver a Carol,
mas algo a impedia. Dentro dela se debatia duas vontades, porém não queria se
lembrar de coisas que lutou para esquecer, entretanto ainda tudo aquilo
machucava ela por dentro e só agora no presente momento é que pode perceber que
a magoa e a dor que ele causará estava ali tão viva.
Mesmo apreensiva se levantou lentamente e andando devagar
pelos corredores chegou onde Caio estava. Olhou pela vidraça e procurou Carol
no meio de tantas meninas. Caio apontou na direção da menina para ajuda-la e
colocando a mão no vidro Dora assistiu a cada movimento delicado daquelas
garotas. Emocionada deixou as lagrimas rolarem e Caio pode reparar que aquilo
tudo mexia com ela, mas se deteve em objetar sua opinião e preferiu que ela
estivesse melhor para poder conversa.
(********)
Na lanchonete os três se divertiam com as brincadeiras
que Caio fazia. Era notável que ele gostava muito daquelas duas e faria o
possível para vê-las sorrindo.
-Será que eu posso ir naquele joguinho? – Carol pediu
para Caio apontando a maquina de jogo.
Era um jogo com vários buracos e o objetivo dele era
acertar a cabeça dos esquilos que apareciam aleatoriamente.
-Antes tem que abrir o seu presente. – Dora disse se
lembrando.
Carol abriu o embrulho feliz. E ficou mais maravilhada
quando encontrou lá dentro uma sapatilha de ponta vermelha do seu tamanho.
-Obrigada eu amei. – Disse dando um abraço forte em Dora.
-Eu pensei em comprar uma rosa choque, mas reparei que
você gosta de vermelho diferente das outras garotas. – Dora informou.
Carol pediu para Dora segurar a sapatilha e olhou para
Caio com cara de cachorro pidão.
-E ai vai rolar aquele jogo? – A menina disse piscando os
olhos segurando um sorriso com todos os dentes.
-O que eu não faço por essa garota. – Falou Caio pegando
dinheiro na sua carteira e entregando a Carol que saiu correndo em seguida. –
Acaba com eles garota. – Berrou ele.
Dora riu dos dois e quando Caio voltou o olhar pra ela a
garota abaixou a cabeça fitando sua xicara de café.
-Percebi que você não está nada bem. Aconteceu alguma
coisa? – Caio perguntou como uma voz terna.
-Não é nada. – Dora reservou-se em falar.
Caio via nos olhos dela que ainda tinha algo que
incomodava a garota, pois ela mantinha a cabeça baixa.
-Ei, olha pra mim – Ele chamou a atenção dela com cuidado
– Você é minha amiga e eu me preocupo com você. Seja o que for pode me falar.
-É coisa boba Caio. – Comentou afligida.
Caio colocou sua mão sobre a dela e ela o encarou. Fazia
tempo que ela não sentia seu toque e isso fez seu corpo estremecer todo, porém
conteve as emoções e o seu olhar triste.
-Dora eu sei que a gente não tem se falado direito esses
últimos meses, mas não importa a distancia que há entre nós dois, você sempre
será importante pra mim e pode se abrir comigo. – Caio elucidou – Eu tenho
certeza que tem a ver com o balé. Vi que você não estava a vontade lá na
escolinha...
-Tá bom, eu falo. – O interrompeu – Você sabe muito bem
que tenho meus problemas com meu pai, então a questão não é tanto com o balé e
sim por causa do Augusto. – Suspirou lembrando se e Caio a ouviu atentamente - Quando eu tinha 6 anos eu sempre quis fazer
balé e eu implorei para meu pai colocar nas aulinhas e com muita relutância
consegui. Eu era apaixonada pela dança e era a aluna mais aplicada, sempre fui
a que mais prestou atenção nos movimentos e a professora me enchia de elogios
quando eu conseguia acertar nos passos. Eu chegava em casa muito feliz e queria
que meus pais vissem o que eu aprendi, mas eles estavam sempre ocupados
brigando. - Nesta hora Dora fez uma careta - Isso me deixava muito triste,
porém eu não desisti. Depois de um ano e
meio finalmente chegou a vez de eu participar do meu primeiro recital. Imagina
minha felicidade eu me preparei tanto para aquilo, minha mãe mandou fazer a
roupa, fiz penteado e maquiagem no salão tudo estava perfeito. – Dora baixou a
cabeça quase deixando as lagrimas caírem e ficou calada.
-O que aconteceu?
- Caio quis saber. – Fala vai fazer bem.
- Então... eu cheguei em casa e encontrei meu pai
terminando de fazer as malas... – Dora começou chorar se lembrando daquele dia.
-Papai você vai viajar? – Perguntou a garotinha triste
por saber que o pai não estaria na sua apresentação.
Augusto fechou a pequena mala e saiu do quarto.
-Pergunta pra sua mãe. – Respondeu de forma rude.
Isabel percebendo a tristeza da filha procurou ser
compreensiva.
-Querida o papai tem que ir, mas ele volta pra te ver. –
Disse agachando perto da sua filha.
Dora tão pequena olhou para seu pai esperando que ele
dissesse algo.
-Agora vai mentir para sua filha. – Vociferou Augusto. –
Sabe que eu não vou voltar.
-Por que papai? – a garotinha começou chorar.
-Eu iria conversa com ela depois. – Isabel disse brava
para o marido.
- O que está acontecendo? – Lia com uns 12 anos apareceu
ouvindo a briga.
Lia fitou a irmãzinha que chorava e não entendia nada.
-Lia leva sua irmã para o quarto. – Pediu Isabel.
-Eu já vou. – Augusto falou dando as costas.
Dora se soltou da irmã, correu até seu pai, segurou nos
braços dele e com lagrimas implorava para que ele não fosse.
-Por favor papai não vai. Meu recital é hoje. – A
garotinha chorava de soluçar – Não me deixa.
Augusto não disse nada pra ela.
-Segura ela. – O pai da menina ordenou Isabel.
Dora tentou secar as lágrimas que ainda caiam e Caio
passou um lenço de papel pra ela. Dora limpou os olhos sem que borrasse a
maquiagem.
-E o que você fez? Digo, você dançou? – Caio segurava a
mão dela acariciando-a.
-Mesmo estando atordoada eu dancei e como sempre eu
tropiquei nos meus próprios pés. – Disse querendo rir com sarcasmo – Eu iria
sair dali correndo chorando, mas me levantei e fiquei até no final e fui
aplaudida de pé. Depois fiquei tão magoada com meu pai e com tudo que não quis
mais dançar e foi o que eu fiz.
-Nossa. – Caio admirou-se – Eu sinto muito.
-Dói quando eu penso em como as coisas aconteceram, mas
você tinha razão... – Deu um sorriso quando já havia parado de chorar - ... me
fez bem. Acho que eu não aguentava mais guardar isso comigo.
Caio sorriu pra ela e percebeu que realmente a garota
estava bem em por aquilo tudo pra fora. Ele lamentava muito por tudo que ela
passou e queria poder abraça-la, mas estavam em um lugar publico então teve que
se conter.
-Dora se me permite gostaria de mudar um pouco de
assunto? – Caio foi cuidadoso – Queria falar sobre nós.
-O que temos nós? – Perguntou curiosa.
-A gente se beijou. Quero dizer; você me beijou. Se
lembra, lá na luteria? – Dora fez uma expressão de espanto – Eu sei que tem um
tempinho, mas pra mim é como se fosse ontem.
Dora ponderou por uns minutos.
-Olha Caio...
-Pronto! Podemos ir embora acabei o jogo. – Carol chegou
interrompendo a conversa.
Revoltado Caio levou as duas embora. Sua expressão não
era das melhores e Dora percebeu a chateação do rapaz. Era sempre assim quando
estavam a sós, sempre aparecia algo ou alguém para interromper e isso deixava
Caio frustrado.
Chegando ao prédio Caio e Dora foram entregar a garota e
a chave do carro no apartamento dela e os dois seguiram calados até seus
respectivos apartamentos.
-Caio...- Dora pegou pelo braço dele antes que o mesmo
abrisse sua porta – Depois terminamos nossa conversa. Que tal na viagem? – Dora
sugeriu.
- Por mim tudo bem. – Caio finalmente deu uma amenizada
em sua expressão.
-Até amanhã. – Dora se despediu com um beijo no rosto
dele.
Caio encostou-se a sua porta e cruzou os braços
observando ela abrir a porta dela.
-Boa noite narizinho. – Disse ele fazendo a garota sorrir
ao lembrar seu apelido.
Ela entrou em casa feliz e foi direto para seu quarto,
precisava arrumar as malas e ligar para sua irmã e amanhã começaria suas férias
ao lado de seus amigos e era isso que importava no momento.
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